Em julho de 2004, a revista TRIP envia seus repórteres-pulgas à segunda Festa Literária Internacional de Paraty e mostra o que não saiu na Caras nem na Bravo
por Ronaldo Bressane e Bruno Torturra Nogueira [fotos]
– Isso aí que tu tá fumando é maconha, merr’mão?
Ser uma pulga pulando no pêlo de um viralata em Paraty é classe. A gente tem acesso aos eventos mais inesperados.
– Polícia!
Como assistir a dois escritores e um jornalista tomando um enquadro, ao serem flagrados com um back. Localização: no meio da Rua da Cadeia. Mais precisamente: sob a bandeira que tremula o nome de Moacyr Scliar. Mais bandeira impossível. Salto pro bolso do escritor para ver melhor.
São dois. O que fala, nervoso, orelhudo, e o outro, quietão, barba, que apresenta ao lesado escriba suas credenciais de Polícia Civil. O escritor olha pra bandeira do Moacyr Scliar e fala pro repórter:
– Pressenti que fumar debaixo de um médico surrealista ia dar merda…
O orelha atalha:
– Chega de gracinha, rapá. Infelizmente, vou ter que recolher vocês pro distrito…
Então, por que não leva logo?, penso com meus pulguentos botões. Na cara o que vai acontecer – uma hora depois:
– … maish com uma cerrrvejinha, sacumé, a gente pode pensarr milhorr…
Quando aparece, saído de sua pousada, o Daniel Galera, amigo do primeiro escritor:
– E aê? E aquela ceva?
O escritor segura o riso; os meganhas olham pro lado.
– Então, Galera, sabe que é, estávamos conversando sobre a crise na crítica literária com esses dois professores da UFRJ…
– Prazer, Juan.
– Prazer, Jonas.
– …e depois a gente se encontra em frente à Matriz, beleza?
– Massa…
Galera estranha, mas engole, parece, e sai fora. O escritor decide:
– Cara, não tem cerveja nenhuma… nós somos escritores, você sabe que no Brasil não se valoriza literatura, é pior que ser policial, com o agravante que você nunca vai ser herói se tomar um teco. Então, não temos grana nenhuma, me desculpe. Você faz o que achar que é certo…
E volta a tremer. O cana dura se vira pro cana doce e diz pro escritor:
– Vou aqui parrrlamentarr com meu colega…
Cinco minutos, volta:
– Olha só, a gente vai aliviar a barra de vocêish… A gente só não queremosh que saiam por aí dizendo que a polícia de Paraty deixa qualquer um fumar na rua, tá me entendendo? Fuma em casa, fuma na pousada, mas na rua não, meu cumpadi… Beleza?
O escritor, quase emocionado, devolve:
– Puxa, gente, eu sabia que dava para conversar com gente educada como vocês. Vou até te dar um livro meu…
O orelha escancara a fuça:
– Aí, que maneuro! Pô, o que é, puisia?
Puisia. Ele disse puisia. Que nem o Zé Miguel. Argh! O escritor, mão de Parkinson, garrancha um autógrafo:
– Aí, valeu mesmo… tem soneto? Sou amarradão em soneto. Sempre leio uns sonetos pra minha gata… Aí, vamos nessa. Um presente sempre é bem-vindo!
Essa não. Decido pular do bolso do escritor pra dentro de sua bolsa. E caio em um quadrilátero colorido, que tem um cheiro bom… Mordo. Gosto de sal. Parece… Essa não. LSD!
Mereciam ter ido em cana.
GLOBALIZAÇÃO e GUGU LITERATO
Um pouco antes disso, esses mesmos escritores estavam em ambiente mais refinado. Na casa do Irineu. O Irineu Marinho. Sim, o dono da Globo. De cachorro em cachorro (não falta viralata na cidade), vou entrando como quem não quer nada… pulo no cangote da Paula Lavigne. Almoço só pra diretoria. Na entrada, me cumprimenta uma gordinha escultura de Botero. Ali um Roy Lichtenstein, acolá um João Câmara… e Marilyns de Andy Warhol sorriem ao lado da tábua de sobremesas. Contorno a piscina interna, que até Calígula invejaria, e vou pro almoço ao ar livre. Soterrada sob um gigantesco chapéu (pensou que a Flip era o Jóquei Clube?), dona Siri Hustvedt, espousa de Paul Auster, prova um bobó de camarão – teve quem pensou em incesto. Pobre coitada: a autora de O Que eu Amava foi um trocadilho ambulante durante toda a Flip.
Trocadilho: o Marcelino Freire solta que aquele ali era o bobó da corte. A Ivana Leite reclama que o estrogonofe está insosso. Que curioso ver Auster palitar seus dentes enegrecidos de nicotina. E Martin Amis, tão inglês, bater a cinza de seu cigarrinho no gramado. No tempo que o doutor Roberto era vivo, era melhor… Pior é ver outro penetra papeando com o príncipe Joãozinho de Orleans: Gugu Liberato. Ele mesmo! Fazendo o quê, na casa do inimigo? Aliás, fazendo o que na Flip?
– Estou lendo o Código Da Vinci. Estou adoraaaaando…
Que conversinha. Por trás dos dois, uma placa: Melhor Ser um Bêbado Famoso que um Alcoólatra Anônimo. Como assim, seu Marinho? Decido escapar do casarão espetado no muque bombado de um dos amiguinhos do Gugu (Gugu Literato, sopra Elisabeth Vargas, mãe do Chico Mattoso). Vou parar no show de abertura da festa. Ninguém pede credencial ao viralata em que me atiro, e adentro a Tenda da Matriz.
Saca quando você fica com vergonha por uma coisa que outra pessoa fez? Assim é com o showlestra do Zé Miguel Wisnik. Tudo tão lindo… o grande sertão que é o mundo… a metafísica das veredas… e a puisia dos vaqueiros! Eu olhava o Angeli com cara de skrotinho atolado – devia estar pensando “por que fui ficar bem na primeira fila? Agora não dá pra sair!” – e me sentia do mesmo jeito ouvindo aquele papo pra boi dormir. Mais constrangedor é quando o Zé pára de falar e sai cantando. Parece musical dos anos 40… e sem legenda. Uma canção tinha o espetacular verso “Todo mundo é feliz no sertão”. E tome Arto Lindsay “interpretando”, Arnaldo Antunes com sua voz de travesseiro, a Mônica Salmaso que só falta nos pegar no colo e ninar… Tirando o incrível Uakti, bocejos. Emocionado, o professor-cantor fez uma pausa dramática e diz: “Agora estamos prontos para Caetano Veloso”.
Aiaiai.
Felizmente, Caê é profissa: lê a carta de Manuel Bandeira para Guimarães Rosa, canta duas e vaza. Nisso, escuto da assessora do Gugu, que acaba de falar ao enésimo repórter que “está lendo o Código Da Vinci e achando maravilhooooso”:
– Vamos embora, agora já fomos vistos e fotografados. Ou você vai querer ver alguma palestra?
TRANSGRESSOR
Mais de 500 pessoas na platéia deixam qualquer um abalado. Que o diga um escritor da nova geração. Durante um debate, resolvo me refestelar no casaco de um deles – neobeat, aquele cheirim de brechó me pareceu um cafofo aconchegante. O escritor não pára de se mexer na cadeira, trocando a bunda de banda pra banda. Logo vejo que seu estremunho tem a ver com movimentos peristálticos. Ah, aquela caldeirada de frutos do mar tinha virado gás metano altamente explosivo… Não deu outra – mal cessaram as palmas após sua fala, o neobeat saiu correndo da mesa na captura de um banheiro. Nem deu tempo pra um monólogo interior: no que sentou, o escriba vê-se mais feliz que pinto no lixo. Falar em lixo, o WC fica mesmo uma Bagdá, pós-moderna e fragmentada.
O aperreio é na hora da faxina. Ensinado pela mulher, o escritor, ao conduzir a limpeza, tem por hábito passar o papel por sob o falo. Daí que acaba se melando mais que poema parnasiano. Em bom português: o escritor mete a mão na merda. Tudo beleza – só que na cabine química não há mais papel, porém. Nem água. O escritor sai do WC aliviado – e preocupado. Nenhuma torneira à vista. A mão coça… repórteres se aproximam, elogiando sua leitura. Quando vê, está dando autógrafos… e apertando as mãos de seus fãs… Poesia, fezes és, já disse João Cabral. O escritor, escatológico, pós-moderno, deve estar rindo por dentro. Resolvo me picar dali.
KING KONG 3
Nessas, cruzo um truta, uma pulga barbuda toda estrupiada.
– Já tentou picar fibra de vidro? Espia só. Tô com o ferrão todo fodido.
– Como assim, doido?
– É que eu saí lá do almoço no Irineu mais bêbado que carrapato de puta apaixonada. Você lembra, né? Quando vi o Gugu por lá não agüentei. Lasquei minha picadura nele e cochilei no couro cabeludo do Liberato. Acordei na pousada do Sandy, enrolado em uma escova de cabelo. Resumindo: escutei que a dona da pousada estava embarcando para uma praia particular pra mostrar a um jornalista seus macacos gigantes. Eu nunca tinha andado de barco, nem visto macacos, pô. Peguei uma carona na barba do repórter. Porra, que lugar sensacional! Casa colonial, praia exclusiva, rotweillers suculentos…
– Onde é?
– O pico chama Sítio Bom Jardim. Só dá pra chagar de barco. A dona, Sandra, acho, Sandra Foz, é isso, adora uma caipirinha. Eu também, você sabe… Dez minutos e eu já pulava torto. Aí o pessoal foi ver os tais macacos. Tinha dois, bem mal-encarados, cheios de musgos nos pêlos, meio nojentão… Mas era uma chance única de provar sangue de gorila. Fui com tudo. E POU! O bicho era de fibra. Sabe quando você fica sóbrio de repente? Foi isso. Voltei para a barba do jornalista com as quelíceras latejando. Aí que fui entender. A Sandra, além de dona da pousada, é viúva do dono da Paris Filmes. Lembra daquelas propagandas da pousada do Sandy antes dos filmes?
– Lembro sim.
– Então, tá explicado. Acontece que em 79, quando lançaram o filme King Kong, fizeram uns bonecões de mais de três metros para promover a película. Boneco classe A, feito na Argentina, com pelo de rabo de cavalo. Quando acabou a propaganda não tinham onde colocar os King Kongs. Não deu outra, levaram os macacos para a beira da praia. Estão lá há mais de 20 anos, tomando sol e criando limo na pelúcia.
– Bizarro…
– Pois é. Mas bizarro mesmo foi a volta. O mar tava meio mexido, eu breaco, meio tonto. Vomitei sangue pra cacete.
– Puta nojo!
– Pois é. Coitado do jornalista. Foi tudo na barba dele.
– Foda, hein… Ó, vou pegar carona noutro dogue pra ver se me infiltro na palestra de Chico e Auster…
MACACAS-DE-BIBLIOTECA
Mas na Tenda dos Autores, nem os cães têm vez. O carioca leria um trecho do livro do novaiorquino e vice-versa (Noite do oráculo e Budapeste). Não posso ver: bem-lôco do ácido, fico noiado, espiando a fila que já se forma para a autografagem. Me chama a atenção uma mulher com a saia toda suja. Chego perto: não é sujeira – são autógrafos de vários convidados da Festa. A macaca-de-livraria, ou maria-teclado, se chama Maria Isabel – como a melhor cachaça local – e é artista plástica (leia-se faz trampos de durepox). Diz a um fulano que estava trabalhando na organização mas foi despedida por causa da tietagem explícita. Sou pulga mas não pago mico: meio sem-graça com o deslumbre da imprensa em cima do Chico, sarto dali pra praça da Matriz.
Cerca de 700 pessoas lotaram o auditório de 500, os 2000 lugares da Tenda da Matriz (quer dizer, um telão coberto) foram tomados, e a praça começa a ser invadida por cadeiras – mais umas 2 mil pessoas ficam ali, à mercê dos telões e do sereno. Cena de Casa Grande & Senzala. Não sei se é o LSD, mas a voz do Paul Auster está esquisita. Depois de um tempo, saco que enfiaram uma intérprete feminina no guapo tabagista – bem na hora em que ele está lendo “Fui dar em Budapeste”… Índios, senhorinhas, vendedores de bilhete de loteria, playbas locais, pé-sujos, catadores de latinhas, hippies, crianças e outros habitantes do mundo dublado encaram o frio de 7o pra ver nos telões nosso campeão de esconde-esconde comentar que “acho bom que o escritor saia da toca e se exiba um pouquinho”. Pois é, o Hollanda conhece a sutil arte de aparecer. Vamos ver como ele se sai no futebol, amanhã.
ESCOLINHA DO TITIO ATUM
“Vai na minha, brother: fruto-do-mar dá barato.” Tipo, não levei a sério, fiquei num canto, quieto. Já tinha picado a Siri, mulher do Paul Auster, e não tinha batido. Esse cara tava de brincadeira, e eu de saco cheio: queria um lance mais high-performance, alucinação pra valer. Ele insistiu: “Tem uma parada favorita rolando por aí, meu chapa. Chama Atum.” Paguei pela informação e saí atrás do tal Atum.
Milton Hatoum; escritor premiado; professor e cidadão amazonense. Ele tava em Paraty na função de ministrar uma oficina de literatura pra autores inéditos. 50 aspirantes a escritor (gente jovem cujo grande sonho é desperdiçar a vida escrevendo) brigando por dois prêmios de 12 mil reais. No melhor estilo big brother, mas sem as gostosas. Cada um abaixando as calças e mostrando a respectiva verossimilhança – ganha quem tiver a maior. Primeiro dia de aula, sala cheia, parti pra cima, pulei e mordi o Atum. Uma, duas vezes, bem na testa. Ele nem se abalou, seguia falando que o Marcel Proust escrevia de 12 a 15 horas por dia, e que literatura é lavoura. “O ângulo narrativo repercute em toda a história”, dizia o Atum. “O enredo tem a ver com uma casualidade que se revela aos poucos.” Vez ou outra alguém interrompia e tentava desviar o Atum de seus propósitos: “Atum, quando devo usar aspas, quando devo usar travessão?” Ou: “Atum, posso ir ao banheiro?”
Tudo em vão, ele continuava, firme, sempre: “Em termos gráficos, o romance é uma senóide. A novela, ao contrário, não exige digressões. O romance é uma história particular, contada por um narrador particular, para um leitor particular. O tempo não existe fora das personagens.” O Atum não parava de falar nunca. Por um momento pensei que aquilo fosse coisa do Gugu, tipo uma pegadinha. Bad trip.
MALDITOS POLICHINELOS
Penetrar no jogo não foi fácil. Além de vedar o acesso do busão a cães, não deixavam um qualquer entrar no clube onde o fludoente Buarque montaria seu circo de futebol e feijoada cercado por jornalistas de todos os lados. Nada que uma pulga safa não consiga. Vejo de longe dona Siri e pulo em suas longas pernas. Acharam que eu não ia tirar uma casquinha da mulher?
– Mas em casa, vocês não competem? – um jornalista pergunta a Paul Auster.
– There is no competition… é maravilhoso ser casado com uma escritora. Ela é minha primeira leitora e vice-versa.
– Mas quem é que lava os pratos?
– Huh, nisso sim, tem competição… para quem sai correndo da cozinha mais rápido – ri Auster, mostrando a dentadura nicotinada. Aproveito pra pular dali e ir conferir a tal feijuca.
Fuleiragem! No prato do pernambucano Raimundo Carrero, nem paio tem. Um agüaceiro só.
– Ma rapái! Nem quando eu passava fome eu tinha visto feijoada mais magra. Pelo menos tem feijão! – ri o autor de Sombrias Ruínas da Alma.
Pulo pro campo. No time dos paratienses, todos com camisa do Flamengo, uns fulanos com nomes tipo Cazuza e Alicate. Só um usa chuteiras; os outros estão descalços. No time do cantor de “Carolina”, de escritor, só ele. No banco, Zé Roberto Torero, Michel Laub e Zé Miguel Wisnik. Este último me constrange de novo – o carção lá em cima do imbigo, começa uma lamentável série de polichinelos. Eu não vi esse exercício desde os tempos em que era uma pulga juvenil. Quase peço pra ele voltar a cantar, quando noto Auster sorrindo complacente:
– What a fuck is that? Poor man, is he ill?
O técnico dos Chicórios é Luiz Schwarcz, editor da Companhia das Letras. Que prova, como técnico, ser um grande editor. Nem o Geninho grita tanto:
– Mete no Chico!
Como assim, seu Luiz? A cada vez que Chico se enrosca na bola, suspiros feminis ecoam da arquibancada garoenta. Quando tudo vira chuva, a debandada se generaliza. E quase ninguém vê o gol buarquiano, finzinho do jogo. Marmelada: antes de ele bater na bola, quase deu tempo do cantor-escritor tirar um pente do calção e assobiar “Retrato em branco e preto”.
SEDE DE SANGUE
No carnaval da bunda-quadrada – ou a micarônio, micareta de neurônios, diz Xico Sá – só se faz exercício desviando das coloniais pedras bêbadas. De cão em cão, a fleapenetra aqui ouve e vê de tudo. Às 4 e meia da manhã, Ian McEwan e Auster irrompem no meio da juventude transviada que manda pinga com mel na frente do Dinho’s Bar. Travadaços de caipirinha. Sir McEwan reclama para Auster:
– Dammit, por que não asfaltam essas ruas?
Saem rindo até a pousada. Na recepção, a mulher de McEwan faz uma cara mais feia que o Colm Tóibín. Este agarra um jornalista que mineiramente ouve tudo ali perto, para tomar umas no Che Bar. O jornalista questiona sobre o processo de criação de História da Noite. O autor irlandês não entende:
– Are you talking about our night, my friend?
Outro que leva uma cantada em cima da outra é Marcelino Freire. Depois de ser aplaudido em plena leitura – um nostálgico conto gay –, volta e meia surge alguém de trás, pedindo um autógrafo, a mão no ombro:
– Gostei muito da sua literatura…
A neblina baixa, e, à medida que a Flip sai mais na Globo e nos jornais, descem junto celebridades literárias tipo Fafá de Belém, Aécio Neves, Bruno Barreto, Patrícia Pillar, Ciro Gomes, Preta Gil, Hector Babenco ETC. Ninguém é superado por Luis Fernando Verissimo, que atrai mais fãs e câmeras que a Mona Lisa (o sorriso é semelhante). A papagaiada come solta em cima dos escritores. Caetano teve de mudar de pousada por causa do assédio. “Antigamente, a gente escrevia um livro, esperava uma resenha e voltava pra casa”, lamenta Ian McEwan.
Margaret Atwood não pára de contar piadas: “Um escritor morre e tem a opção de ir para o céu ou o inferno. Vê uma sala infinita, com milhares de escritores tomando café, jogando papel no lixo, em crise de bloqueio criativo. Pede para ir para o céu. Vê uma sala infinita, com milhares de escritores tomando café, jogando papel no lixo, em crise de bloqueio criativo. Não entende a diferença. São Pedro explica: esses aqui são escritores publicados”. Paul Auster comenta que se sente um astro de rock – “Ninguém me conhece no Brooklyn”. Uma tiete vai pedir autógrafo ao jornalista Zuenir Ventura e ouve:
– Desculpe, meu nome não é o Zuenir. Sou José Saramago. (Na Flip do ano anterior, uma fã do Saramago havia pedido autógrafo a Zuenir.)
Observado pelas meninas da Companhia de Teatro Satélite, musas absolutas da Flip, Cardoso, o tocha humana do 100% Chongas, tenta virar uma lata de cerveja ao lado de Emílio Fraia, seu parceiro da oficina literária de Milton Hatoum (também chamada de Escolinha do Titio Atum), lotado de celebridades internéticas em busca da bolsa mensal de R$ 2 mil ao vencedor. Não consegue – e se baba todo na camiseta laranja. Marcelo Benvenutti, cercado por comparsas vikings (onde os gaúchos passavam não sobrava cerveja), apenas balança a cabeça consternado. Um urubu de asa quebrada rasteja pela praça. Sem perder a pose, Marquinhos Behute, dono da Mercearia São Pedro, tasca-lhe o nome:
– É o Urubaldo!
Porque João Ubaldo Ribeiro, enciumado com os holofotes sobre Chico e Auster, resolveu não vir à Flip e saiu falando mal da festa nos jornais… O urubu aciona as câmeras digitais dos turistas gringos:
– Look how gorgeous that bird!
Eles nunca tinham visto um urubu e já o chamavam de meu louro. Devem ter passado a vida lendo Dostoiévski. Joca Terron reclama da crítica: “Como podem abrir a tampa da jarra enquanto o liquidificador está batendo?”. No bar Papagaio, Reinaldo Moraes reclama que a crítica não entende seu processo de criação: “Eu sou cubista, pô!”. Passa das seis horas, é o último sábado flipesco, aí no meio do mar uma barca solta fogos e rojões para colorir o crepúsculo – a cena é toda regida por Moraes, que, no entanto, dá as costas ao espetáculo (puxando a narrativa para gravitar em torno de sua caipirinha). Mais tarde, na esquina da rua da Cadeia com a praça da Matriz, enquanto fazem um bico de segurança pra um boteco, um PM jacta-se para o colega:
– A mina era virrgem, e ainda era menor. Mas sabe, o álcool às vezes estimula e às vezes derruba. De modo que somente atingi uma ereção semiplena, entende?
Entendemos, claro, embora seja meio inexplicável. Licença sem poesia. Na saída da exibição de Carandiru, Martin Amis comenta com Jeffrey Eugenides e Isabel Fonseca:
– Pretty violent, don’t you think?
Comentário vindo de um escritor que apóia a posição inglesa no Iraque… quando afirmou sua posição na palestra (“Ainda tenho esperanças de que encontrem as armas de destruição em massa”), Amis foi aplaudido. Será que entenderam o que ele disse? Ou o gênio de Money só exercitava sua ironia? Que vontade de simplesmente pegar um livro e ler. Ver esses impávidos autores de perto é muito esquisito. Parecem fantasmas ventríloquos saídos das orelhas, com a rotação mais lenta e em dublagem do SBT. E me lembro subitamente que se passaram cinco dias e ainda não comi ninguém. Vou colar ali naquele escritor. A jornalista com quem ele está conversando parece portar uma bela calipígea. Com licença. (Colaborou Emílio Fraia)
“- Olha só, a gente vai aliviar a barra de vocêish… A gente só não queremosh que saiam por aí dizendo que a polícia de Paraty deixa qualquer um fumar na rua, tá me entendendo? Fuma em casa, fuma na pousada, mas na rua não, meu cumpadi… Beleza?
O escritor, quase emocionado, devolve:
– Puxa, gente, eu sabia que dava para conversar com gente educada como vocês. Vou até te dar um livro meu…
O orelha escancara a fuça:
– Aí, que maneuro! Pô, o que é, puisia?”
Puisia, puetagem. Dá na na meshma
Gente!!!!! Vocês sabiam que Paraty não tem esgoto e nem sequer água tratada!!!!????? E aí vai tudo isso fazer “curtição” literária naquilo que considero um absurdo sanitário!!!!! O prefeito atual está na maior batalha para conseguir isso, a Cia de Saneamento do Rio abandonou a cidade !!!! O prefeito atual está na maior batalha com dezenas de politiqueiros querendo ganhar alguma coisa com esse saneamento e ele sabe que botar saneamento não dá votos neste país onde a ignorância perpetua a barbaridade de que cano enterrado “não dá votos” pois ninguém vê!!!????
Quando é que esses rebeldes bons para destruir patrimônio público vão perceber o profundo grau de sua alienação????!!!!