Os novos sete pecados capitais


>> Materinha pra pagar a Germana das crianças publicada na VIP do mês. Quer dizer: a VIP reduziu as oito páginas originais a uma dupla… assim, segue o texto sem nenhum corte capital

Pecai, irmãos

Luxúria? Gula? Ah, não seja ridículo

Na boa, o leitor é safo e não está nem aí se vai tocar harpa ou virar espeto de churrasco. O céu e o inferno moram ao lado. E quem decide isso é só você, não adianta pedir para ninguém ensinar. Só lembramos que o inferno, neste quesito, é a danação pública, o apedrejamento da sociedade, ou, muito pior, a desaparição, a morte do RG. A Queimação de Filme. Pior que ser motivo de chacota é ouvir um “Fulano? Quem?”.

A noção de pecado é volúvel. Varia de época para época. Os antigos sete pecados não funcionam mais, não dão conta das mudanças da sociedade (da sociedade ocidental). E, evidentemente, nem tudo o que é errado é um pecado. Há pecados de ontem que são perdoáveis hoje. Sem querer levar a noção de pecado ao pé da letra, que ninguém aqui é santo, o que pega mal (Mal, em maiúscula) é o pecado social.

Assim, seguindo a opinião pública, as convenções, as aparências e principalmente o noticiário, imaginamos uma nova lista de sete pecados capitais. Saem Preguiça, Vaidade, Avareza, Luxúria, Ira, Gula e Inveja, e entram Deprê, Moitismo, Salto-Alto, Insustentabilidade, Deduragem, Sedentarismo e Falta de Noção. Agora é com você.

Do blog da Dani Dias
Do blog da Dani Dias

Moitismo

Ser discreto, low profile, cuidar da própria vida e não estar no Facebook nem no Orkut é pecado mortal. Não ter celular, não twittar, não blogar? Transtorno Tímido Compulsivo – se não for um tipo de vaidade ainda mais pervertida. Na era do Eu, quem fica na moita vai para o inferno. Imagem é tudo, lembra aquele slogan de refrigerante?

Um paparazzo flagra um famoso ou subfamoso almoçando sozinho, por exemplo. Pega supermal. Breve vão “descobrir” que o solitário comedor está brigado com os companheiros de profissão, que tomou um pé da namorada, que está sendo boicotado pelos chefes. Um homem sozinho em um bar já chama a atenção – por sua insociabilidade. Agora, vá uma moça bonita jantar sozinha. Ou está esperando algum cliente ou é uma periguete pronta para te atacar ou deve ser uma chata, largada por amigos e amores. Ela não pode estar discretamente curtindo sua comida. Ela só pode estar querendo coisa.

Vivemos a era de multiplicação de imagens – aquilo que Italo Calvino, em seu obrigatório Seis Propostas para o Próximo Milênio, temia que acontecesse: soterrados por um dilúvio de imagens, a falta de cuidado com o próprio registro visual acaba abrindo uma brecha a qualquer esperto que invada nossa privacidade e a torne propriedade alheia.

Grande parte dessa nuvem de imagens se dissolve imediatamente como os sonhos que não deixam traços na memória”, escreve o italiano (“Exatidão”). A multiplicação de imagens banaliza qualquer imagem – e se por um lado ser famoso é bom porque abre portas, por outro lado ser arroz de festa de mídia faz despencar suas ações no mercado.

O grande lance é controlar a própria imagem. Há aqueles famosos obcecados por discrição, que quebram câmeras e reclamam do assédio da imprensa – mas que, engraçado, moram justo no Leblon, o paraíso dos paparazzi. E há famosos que dominam a mídia como ninguém: Caetano Veloso, por exemplo, só surge quando quer. Recentemente apareceu uma matéria no site Ego em que o baiano ia a um restaurante japonês com o filho Moreno e um casal de amigos, e logo em seguida todos davam uma passada no supermercado. As legendas eram “Caetano ri enquanto observa frutas e legumes” – e era isso mesmo que você via, Caetano rindo enquanto observava frutas e legumes. Não seria surpresa se a gente descobrisse que a matéria tinha sido toda armada pelo autor do chatíssimo Zii e Zie, que queria tirar uma onda das revistas de celebridades.

Há também aqueles famosos tão discretos que, quando aparecem, criam confusão – como Chico Buarque, verões atrás, saindo do mar de mão dada com uma dama casada para todos verem. E há os famosos famosos justamente por desaparecer: caso do escritor Rubem Fonseca, o grande sábio da discrição, que, imitando o norte-americano J. D. Salinger, nunca deu entrevista e foi raramente fotografado. Para espezinhar o exibicionismo, certa vez Rubem matreiramente falou a um repórter da Globo, em plena histórica queda do muro de Berlim, sem ser reconhecido – deu entrevista como um anônimo brasileiro que vivia na Alemanha, “José Fonseca”. O repórter não era qualquer um – era o excelente jornalista Luiz Carlos Azenha. Ooops.

Porém, há que se ter cuidado com os assessores de imagem sem noção (sem-noção é o pecado mais ubíquo de todos). Outro dia recebi um e-mail que me informava que certa starlet do SBT havia aderido à depilação íntima definitiva. Infelizmente, o e-mail não trazia fotos. Ou mostra ou não mostra, pô.

http://www.munesc.org/
http://www.munesc.org/

Insustentabilidade

Ah, quer ser rico mas não comprou sua cota de carbono? Cérbero te espera. Tudo bem você ter uma pick-up beberrona de diesel e vomitadora de fumaça, contanto que desfile na coluna social com sua bike ou sua sacolinha ecológica. Em tempos de aquecimento global, é bacana entupir o trânsito e arrotar “compromisso com a sustentabilidade”. Veja bem, não precisa se preocupar de verdade – o mundo não vai acabar amanhã nem depois de amanhã; talvez, só semana que vem. O importante é aparentar preocupação – vá até o espelho e dê uma franzida no cenho; exercitar um semblante “denso” cai bem.

E não se preocupe só com a natureza. Você tem que se preocupar com todo mundo. Tem que ser “do bem”, reciclar seu lixo, dar uma graninha para o portador de deficiência física que te espera no semáforo (e nunca escreva “deficiente físico”, por favor), doar roupas e móveis velhos para um brechó (de preferência um frequentado por bacanas), participar de uma ONG, visitar o Fórum Social Mundial e praticar sexo verde.

É: recente pesquisa do site Planet Green descobriu que 43% dos norte-americanos usam vibradores durante o nheco-nheco. Nada mais justo, então, pede o site, que você use um vibrador que gaste menos energia elétrica. Ela pode gozar sem que a imagem de uma madeira caindo interfira em sua saúde espiritual e sexual.

Se for empresário, veja lá o que vai fazer com o seu departamento de sustentabilidade. É show de bola mostrar que sua empresa se preocupa com o meio ambiente. Ecologia dá lucro e rende ibope. E não é só a preocupação ambiental: o interesse pelo ambiente cultural também dá pra deduzir do imposto de renda. Mas não tem essa de “fazer o bem não importa a quem”. Importa, ô.

De outro modo, não teríamos quase 70% dos recursos utilizados via Lei Rouanet para patrocinar atividades culturais concentradas no eixo Rio-São Paulo. Sinceramente, patrocinar uma orquestra no interior do Piauí, quem é que vai ficar sabendo disso? É jogar dinheiro fora. Ponha seu nome num festival de música do Sudeste, patrocine um cineasta que seja bem apessoado e fale bem, financie um espaço cultural – você nem vai precisar gastar com marketing depois. Empresarial ou pessoal.

E, poxa, não vai fazer tudo isso sem dar um toque, né? Nada a ver ser discreto aqui. Os radicais chics norte-americanos ensinam: mais que em um homem de sucesso, sensível e desprendido, ser mecenas na mída o transforma praticamente em um santo. Leia a clássica reportagem “Radical chic”, de Tom Wolfe (Décadas púrpuras, L&PM), em que o jornalista descreve como a elite norte-americana deu um jantar para os Panteras Negras nos anos 60 para melhorar a consciência, e medite depois sobre os playboys que lavam a grana no novo álbum daquele rapper favelado.

Tá tudo certo, tanto o mauricinho quanto o rapper querem passear de SUV ouvindo hip hop alto. Conheço um benemérito de sorriso beatífico que por pouco não levita, tão leve ficou ao fazer a caridade de bancar um time de artistas. Sem essa de “faça um filho, plante uma árvore, escreva um livro”: o novo lema é “adote um filho de pais pobres, pague sua cota de carbono, banque um projeto cultural”. A leveza também se aplica ao imposto de renda de sua pessoa jurídica – fazer o bem faz um bem danado ao bolso.

Ficar parado é melhor ainda
Ficar parado é melhor ainda

Sedentarismo

Como você já deve ter sacado, cuidado com a aparência é a chave para o Céu – no caso, ter amigos, uma carreira legal, mulheres chovendo na horta e puxa-sacos por todos os lados. Os gordos que se aferrarem às suas pancinhas e os magros que nunca forem vistos fazendo esporte que reservem sua passagem para o andar de baixo.
Mas pô, escolha bem o esporte.

Não adianta nada secar os pneus jogando tamboréu ou bocha. Pense no glamour. Procure uma academia descolada, grude um iPod no ombro nem que seja para correr só até a padaria. Melhor: faça um esporte radical. Se caiu do skate na terceira tentativa, beleza: o raladão ou o gesso vai fazer sucesso na roda. Agora, quente mesmo é desfilar um bronzeado (pode ser artificial, ninguém precisa saber) e uma prancha no reque da sua caranga muito louca.

Nos anos 80, Wander Wildner dos Replicantes já cantava a bola: “Vive com a herança milionária de uma tia/ vai pra Nova York estudar advocacia/ Ele não surfa nada”. Hoje, nos anos 00, o surfista calhorda sabe que o esquema é exibir o tanquinho em Maresias.

Se bem que tudo isso já datou. Não basta malhar, não basta surfar, não basta soltar flatos durante a sessão de yoga: tudo isso tem de ser acompanhado por uma transformação espiritual, uma metamorfose mental, uma experiência transcendental. Mesmo que você suba e desça os vinte andares do seu prédio de escadas e ganhe as panturrilhas da Daiane dos Santos, o esforço físico não vai compensar se não for acompanhado de belas paisagens.

Sei lá, seja criativo. Faça uma surf trip para uma praia rodeada por rochedos perigosos. Escale o Himalaia. Pule de paraquedas num dia de chuva. Não esqueça de levar a câmera – se você aprendeu direito o catecismo moderno, sabe que, se não tem imagem, não existe.
Tá bom, você está caído de grana e insiste em subir os vinte andares do seu prédio: faça isso do lado de fora. Pronto. Não basta ser homem – tem que ser o James Bond. Mas se nada disso rolar com você, caso seja um sedentário radical, beleza – não custa muito comprar uma Men’s Health e passear com ela debaixo do braço. Na pior das hipóteses, rende assunto.

Basiquinha. Só US$ 299,99
Basiquinha. Só US$ 299,99

Salto alto

Pega mal acumular qualquer coisa: bens, gordura, visibilidade, apego à carreira, brilhantismo. Na Era da Responsabilidade proposta por Obama, em plena crise global, ostentar, ter e aparecer demais está super fora. Focar a “qualidade de vida” e não o excesso de automóveis na garagem é o caminho. O negócio é repartir – nem que isso seja descontado via Lei Rouanet, conforme você leu no pecado da Insustentabilidade – e parecer humilde.

Está claro que o Daniel Dantas não foi processado por suas mutretas, mas sim pelo número de ternos. Dizem que o bom baiano seria proprietário de 400 ternos azuis-escuros absolutamente iguais. Certeza de que foi isso que indignou a dupla De Sanctis-Protógenes: pô, roubar tudo bem, mas 400 ternos iguais? É um acinte.

Tampouco duvido que o pecado maior de Eliana Tranchesi tenha sido as tramóias contraventoras da Daslu, este Paraguai do luxo encravado à beira do mefítico Tietê. O que deu indigestão foi o excesso de imagens douradas nas colunas sociais, a quantidade de matérias nas Wallpaper da vida elogiando o templo das peruas e patrícias. É isso que nego não engole – e louve-se a sabedoria de Tom Jobim ao definir: “No Brasil, sucesso é ofensa pessoal”. Nada mais contemporâneo com a Era de Responsabilidade.

Quer outro grande pecador da acumulação? Michael Jackson. Esse vai varar umas trezentas eternidades no inferno. Não contente em ser garoto-prodígio, provar a genialidade em álbuns como Thriller, vender milhões de discos, mudar a própria cor (e o sexo, vai saber) e viver num paraíso chamado Neverland, o cara deu para pegar criancinhas. Não acredito que tenha sido a pedofilia seu maior pecado. A infância é o último território que o senso comum acredita não ter sido colonizado pelo turismo. E a pedofilia não pode ser considerada um pecado: mais que isso, é um terror da modernidade. O que lançou Michael Jackson ao inferno foi, sim, seu enorme talento – a pedofilia foi somente uma deixa para sua excomunhão.

Se você insistir mesmo em acumular coisas, tente algo inocente, como adicionar desconhecidos em seu perfil do Facebook. Quando enjoar ou quando estiverem achando você popular demais, é só apertar delete. Não são amigos, são figurinhas. Se você acompanhou nosso raciocínio, se ligou que pecador esperto é o que sabe sempre a hora de mudar de pecado.

Nem vem que não tem
Nem vem que não tem

Deduragem

Quem viu o documentário Ninguém sabe o duro que eu dei, cinebio de Wilson Simonal dirigida por Claudio Manoel, Calvito Leal e Micael Lange, assistiu a uma aula de religião moral e cívica. Pra quem não viu, sugiro esta fenomenal reportagem do Pedro Alexandre Sanches. Entre os 60 e os 70, Simonal foi o maior cantor do país – tecnicamente insuportável de tão insuperável, performaticamente avançado demais para a época. Contudo, incorria no pecado mortal do salto-altismo. Era o Cara, mas fazia questão de dizer o tempo todo isso. Numa entrevista, ao ser perguntado se estava se achando por conta do sucesso, respondeu: “Já nasci mascarado!”.

Mas, como narra o filme, Simona vacilou forte. A classe artística, que em peso combatia a ditadura, enxergou no boca-mole um dedo-duro. Jornal de maior impacto junto à intelectualidade, O Pasquim o jogou no paredão dos colaboracionistas. Amigos e admiradores como Nelson Motta, Chico Anysio e Boni sumiram. O prestígio do cantor foi para o lixo. Todo mundo que sentia inveja por seu talento – e odiava seu salto-alto – tinha uma desculpa para se vingar. Simonal deixou de ser convidado para shows, discos, programas de TV. Ser visto com ele fritava o filme. E foi sumindo da memória brasileira. Mesmo nada tendo sido provado concretamente – os registros de sua atividade como espião do governo são controversos –, Simonal virou tabu.

“Fecharam o paletó do dedo duro/ Pra nunca mais apontar/ A lei do morro é barra pesada/ Vacilou levou rajada na idéia de pensar/ A lei do morro é ver ouvir e calar/ Ele sabia, quem mandou ele falar/ Falou de mais e por isso ele dançou/ Favela quando é favela, não deixa morar delator”, cantava o gênio da malandragem (esse sim), Bezerra da Silva. Pedro pode até ter negado Jesus, os romanos o crucificaram, mas o que fica de pecado capital é a xisnovagem de Judas. No tribunal social brasileiro, Simonal cometeu o crime do salto-altismo porém foi condenado por um delito que provavelmente nem cometeu: ser um boca de radar, um dedo de seta, um língua de tamanduá. Protógenes Queiroz, o homem que sabia demais, que o diga.

Manic depression, I get it every day
Manic depression, I get it every day

Deprê

Até mais ou menos a Revolução Industrial, a Igreja considerava a melancolia um pecado capital. Um macambúzio estaria destituído da chama divina, e, portanto, merecedor do fogo do inferno caso insistisse na deprê.

Preguiça, para São Tomás de Aquino, um dos grandes filósofos católicos, era um dos atributos da tristeza. O pusilânime está facinho à manifestação do Demo. Curiosamente, a evolução do capitalismo fez com que a melancolia fosse pouco a pouco sendo substituída pela preguiça – ligada ao ócio, e, portanto, um perigo para o modo de produção. Qualquer caxias adorador do trabalho, que acredita no sucesso profissional como chave para o paraíso terrestre, mandaria um vagabundo passar uma temporada alimentando belzebus.

Hoje, a valorização de expressões idiotas como “qualidade de vida” colocou a preocupação com o bem-estar no topo da cadeia alimentar. Tirar férias, fugir do trampo e ter mais tempo para coçação de saco virou um supremo valor do capitalismo. Afinal, os defensores do livre-mercado sabem: todo vagabundo adora consumir.
O que não pode é vagabundo ficar entediado. Os borocochôs são mais nocivos à sociedade que boas-praças folgazões. Cara amarrada não vende. Por isso propomos um retorno à acepção original deste pecado.

Com essa busca desenfreada pela Felicidade, apresentar-se entediado, merencório ou eventualmente triste pega supermal. Ligue a TV e nos intervalos comerciais você verá tipos saltitantes, solares, felizes como se não houvesse amanhã. Compre uma revista de celebridades e você observará a atriz pular de um aborto direto para uma praia nas Maldivas, um músico corneado casar de novo com a top model do momento, o empresário que tomou um tombo na bolsa dando um pulo na piscina do melhor amigo. Como reclamava o grande melancólico Fernando Pessoa, “todos os meus amigos são campeões em tudo”. Ou será que isso era slogan de um antidepressivo?

Crise? É oportunidade, ensinam os shiniashikis da vida. Compre A arte da guerra, passe óleo de peroba e cole um sorriso colgate na cara, vista uma camisa listrada e saia por aí. Mesmo que lá dentro você guarde a tristeza de três Ian Curtis e dois Kurt Cobain, só abra a boca para cantar “Poeeeira, poeeeira, poeeeira, levantar poeeeira”. Mire-se no exemplo de felizes profissionais, gente que nunca conhece abismo mesmo quando paga mico em cadeia nacional, tipo a Susana Vieira. No país do axé, felicidade não tem fim, tristeza sim. A não ser, claro, em três casos:

Teu time perdeu. Situação em que é bonito ostentar a tristeza nobre dos derrotados em plena luta;

Você é emo. Aí beleza, choramingar par os seus miguxos pega xuperbem. Não à toa os emos são o status quo do rock, invadiram notórios antros de metaleiros e b-boys como a Galeria do Rock, em São Paulo, e estão entre as tribos mais promíscuas da teenlândia;

Você quer comer alguém. Truque velho, sempre engana. Apelar ao instinto maternal das moças com uma puta história triste, do ombro amigo à gruta nacarada de jade é meio caminho andado. Colo foi feito para chorar, por isso tem um cheiro tão bom.

Um amigo vivia com olheiras fundas e um papo caidaço. Certa noite chegou numa roda de bar, lá pras 3 da manhã e confessou: “Tô cansado dessas relações fugazes e rasas da contemporaneidade… Hoje mesmo peguei três mulheres e agora me sinto vazio… Por isso vim aqui beber com vocês!” Compungidos, fizemos o casanova jururu pagar a conta como castigo.

Falta de noção

Não sabe se vestir? Não sabe falar? Não sabe se portar? Vomitou no bolo de aniversário, mandou e-mail para pessoa errada, cometeu gerundismo em público, foi flagrado com traveco, atendeu celular no meio do velório, pagou a passagem da namorada para Paris com o dinheiro público? Volte dez casas de joelhos e reze 2 mil pais-nossos. A não ser que você tenha a capacidade de dar a volta por cima do Ronaldo Fenômeno, fazer merda vai te mandar para o nono círculo do inferno social. A capacidade de tropeçar no próprio cadarço é mortal.

Bem… mais ou menos. Ninguém tem muita noção do que é senso de noção. O que torna este o mais genérico e perdoável dos pecados. E talvez o pecado mais revelador a respeito da nossa boa ou má consciência moral.

Peguemos o caso da Felina, a moça que divulgava vídeos e fotos de famosos com quem teria incorrido em intercurso internético. A Felina postava em seu blog imagens, captadas via webcam, de boleiros como Ronaldo Gaúcho, Alexandre Pato e Vanderlei Luxemburgo, pagodeiros estilo Belo, roqueiros como Tico Santa Cruz e até mesmo de atletas como o Dyego Hyppólito, em pleno cinco contra um.

Evidente vontade de gozar com o pau alheio, falta do que fazer ou espírito de porco, tudo formou no bonde sem-noção da Felina. Que, depois de dois meses dedurando na rede o tamanho dos bilaus das celebridades a quem pentelhou ou masturbou à distância, fez uma autocrítica stalinista e limou todos os posts de seu blog.

Aí fica a pergunta: quem foi mais sem-noção, a Felina que postou as imagens ou os caras que bateram uma para uma imagem qualquer, se deixando ser filmados sabe-se lá por quem? Será que também não é um pouco falta de noção perder tempo vendo o blog? E comentar o blog, não será também uma certa falta de noção do que escrever, do que refletir, do que fazer?

Este é o ponto: a falta de noção é um pecado que ilumina a noção do que é pecado. É uma espécie de peido no elevador que até você se pergunta se não foi você mesmo quem soltou. A falta de noção é o que nos faz mais humanos, porque manés. Perdoai os sem-noção, eles não sabem o que fazem.

Autor: rbressane

Writer, journalist, editor

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