Um hiperpoema inédito de Sergio Cohn*
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1
A Montanha Gelada é uma casa
Sem teto ou paredes.
As seis portas estão sempre abertas
A sala é o céu azul.
Os quartos estão vazios
Uma parede se encontra com a outra
E no centro não há nada.
Nunca tenho visitas,
No frio faço uma pequena fogueira
Quando sinto fome cozinho legumes.
Não tenho utilidade para o gado
Com suas cercas e pastagens –
Ele cria sua própria prisão.
Uma vez dentro, não pode sair.
Pense nisso –
Poderia acontecer com você.
Han Shan (Montanha Gelada), poeta chinês, século VI antes de Cristo
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No 59º minuto da hora final todas as portas foram arrancadas de seus batentes e amontoadas em uma ruidosa fogueira, e somente as dobradiças foram poupadas para servirem de muda recordação de uma história triste e assustadora.
Dan Propper, poeta americano, 1968
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A reação da doença criada
Seria melhor não existirem muros para serem pichados
Grafite na avenida Jardim Botânico, ano 2000
2
Uma vez na Montanha Gelada, os problemas cessam –
Nunca mais uma mente confusa e desligada.
Indolente, rabisco poemas no penhasco,
Aceitando o que vier, como um barco à deriva
Han Shan, novamente
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Ir à deriva no rio da existência
Roberto Piva, 1983
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Não sou eu quem me carrega
Quem me carrega é o mar
Paulinho da Viola, 1995
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> O sonhador insone, de *Sergio Cohn, também procura ampliar o registro temático de sua coletânea anterior (Horizonte de eventos, Azogue Editorial). Tampouco aqui há possibilidade de recuperar as harmonias do mundo, por isso o poeta vai representar “não a cidade ofertada/ mas o sem-fim de ecos/ de uma poça nos asfalto/ não os passantes/ mas o que foge/ à estrada”. A tendência a se refugiar num imaginário cosmológico-ecológico (“a carne do sândalo respirando”), com referências a visionários como Lautréamont e Ferlinghetti, tem como contrapeso a depuração de frases nominais, culminando na imagem precisa do “aquário mergulhado em alto-mar”: o poema habita um fragmento mínimo, que, entretanto, se comunica com o que é imenso e propõe novos modos de percepção.
[Manuel da Costa Pinto, na Folha de S.Paulo, 26-8-6]
ceeeerto…puxando o saco do editor e do crítico amigos…tão brasilll
Lindeza de associação de idéias… pena que tem gente que vem aqui só pra encher o saco! Enfim, seria melhor se não existissem muros pra serem pichados…